E se fosse possível voltar no tempo (III)
E durante a noite eu tinha medos.
É claro dos personagens folclóricos.
Lembra deles.
O "Lobisomem", a "Mula Sem Cabeça", o "Saci-perere", o "Boitatá" e os "Fantasmas ".
Diga-se de passagem que só de ouvir falar deles a noite já era motivo de ter medo.
Mal sabia eu que os "fantasmas " reais iriam me assombrar muito mais por longos anos.
Eram tempos difíceis.
Agora eu estava entrando no período da adolescência.
E já acabará de conhecer o "luto".
Uma fase dolorida.
Perdera o pai que lutava contra um AVC.
Como eu disse, agora éramos seis irmãos.
Os outros quatros tinham ido embora para a Cidade Grande.
Eu ficará com os outros e com minha mãe.
Tempos difíceis.
Agora os brinquedos e as brincadeiras ficaram para trás.
Não era possível.
Era a hora de fazer algo e trabalhar para ajudar na situação financeira da casa.
O meu primeiro trabalho eu lembro bem.
Uma caixa de engraxate ao ombro.
Os materiais de trabalho se resumiram na caixa de madeira, escova, graxas, tintas e panos para lustrar sapatos.
Para mim era um trabalho que rendia alguns trocados.
Para isso era necessário atravessar a avenida de ponta a ponta além, de fazer posto de trabalho na rodoviária, em frente ao cinema, barbearia e praça.
Foi assim o meu primeiro emprego.
Apesar do "luto" e das muitas dificuldades financeiras enfrentadas este foi um período significativo para mim que mostrava uma nova realidade a ser enfrentada a partir daí.
Se eu pudesse voltar no tempo não mudaria em nada neste período vivido.
Só mais tarde na universidade eu entenderia, Pichon, a realidade do luto enfrentado por uma criança e suas transformações decorrentes deste luto...
Benedito José Rodrigues
Enviado por Benedito José Rodrigues em 13/06/2022
Alterado em 13/06/2022